Dias de chuva

Em dias de chuva é mais fácil sentirmo-nos sozinhos. As pessoas ficam em casa, as ruas estão mais vazias, as crianças não brincam nos quintais. Essa é a minha realidade aqui, quando chove. Era a minha realidade em Lisboa também, pelo menos a parte de não haver muita gente na rua, mas aqui exacerba-se, em parte porque não tenho ninguém à distância de um telefonema a quem me possa juntar ou quem possa convidar cá para casa. Sei que posso ir para casa do Florian ou da Jenny, mas ainda não me sinto à vontade para lá chegar sem aviso, sem combinar. Não sei se estarão em casa, não sei se vou incomodar, por isso não quero chegar lá sem ligar. Não o faço com vocês, que sei que estão sempre disponíveis para dar tecto, portanto ainda menos facilmente o faço com eles. Gosto a sério de cada um deles e sei que estarão cá este ano, mais ou menos no lugar onde vocês estão sempre, mas em dias de chuva sinto mais saudades do que noutros dias. Nos outros dias estou ocupada, nos outros dias estou com eles na praia, ou no centro, ou na praça…

Nem a propósito, a Salsa chegou a casa quando eu escrevia e disse que eles vinham cá todos jantar. Benefícios de ter a única casa com electricidade (constante) na vila! A minha família cabo-verdiana chegou pouco tempo depois, enquanto eu e ela cozinhávamos. E assim se esbateu um bocadinho da saudade. O jantar foi óptimo, mais frases em crioulo a serem criadas e a fluírem mais e mais. A Ida, ao chegar, sorriu muito, com uma boca enooooorme mas eu não percebi porquê, achava que era só brincadeira e por isso fazia-lhe caretas. Quando cheguei à sala ela pediu ao pai que me dissesse algo. Não ouvi o que era, mas o Florian disse-lhe logo “diz em crioulo à Ana que te caiu o dente, ela percebe!”, e a Ida voltou a fazer um grande sorriso envergonhado para mim, para eu ver que o dente dela, que abanava desde ontem e que ela já me tinha mostrado ontem e hoje de manhã, tinha finalmente caído. E fazem-me sentir tão bem, estas pequeninas coisas.

Brinquei com ela, com a Nata (irmã de 10 anos) e com o Elton (irmão de 12/13). Corremos uns atrás dos outros, escondíamo-nos e saltávamos detrás de portas. Encontrei mesmo uma nova família, da qual me sinto cada vez mais parte integrante, e é tão bom. Faz-me sentir saudades da minha, claro, mas é tão aconchegante, e já custa pensar que um dia terei de sair daqui…

Choveu toda a noite, o meu quarto teve uma pequenina infiltração (não é só em Lisboa que estas coisas acontecem, eheh) e tive de ir dormir noutro quarto. A electricidade falhou a meio da noite, por isso a minha ventoinha deixou de me arrefecer, e acordei quando já estava a derreter. Enfrentei o pânico de baratas e fui à casa de banho sem acender luzes (porque não havia…), arriscando-me a um encontro de 3º grau com alguma. Não encontrei nenhum ser, o que me fez muito feliz.

4 Respostas to “Dias de chuva”

  1. Olá filhota
    Estamos em Alicante, encontámos há minutos. É curioso ler os teus posts nesta particular circunstância… Não podíamos estar mais longe! Não em km mas em … (cultura, civilização, são palavras típicas, mas que não me agradam) … sofisticação (talvez seja mais adequado).
    Estou no meu portátil num lobby de três andares, mais ou menos a meio de um monstro. Estamos todos no 8º andar. Sim, não me enganei, é o oitavo andar. E por cima há mais sete… Isso: a piscina é no 15andar. Parece-me bem!
    Acho que as fotos não vão dar ideia de nada, primeiro pq não cabe numa foto a grandiosodade disto, e dp pq não tenho arte nem paciência para fazer ereportagem. Sabes como é: antes ver e memorizar que armar em reporter.
    Mas fazer um corredor (1) e dar 167 passos antes da primeira curva… é estranho.
    Estamos óptimos. A avó andar meio baralhada com tanta sala, corredor,m andares, gente. Principalmente gente, são perto de 4000…

    Bem, mas dp haverá tempo para te falar disso.
    Ler o teu texto é sempre um prazer pela emoção que nele pões.
    Os teus sentimentos ambiguos sobre o novo e o que falta, o descobrir e o recolher ao conhecido… O teu rio continua a fluir, com a mesma força e frescura. Só que está a descobrir novos leitos, está a traçar no terreno desconhecido, novos caminhos. E um dia destes sobes num balão e vês o fantástica teia de cursos que se entrelaçam em que a tua vida se tornou. Nunca foste talhada para estuários, mas para deltas!
    Navega! Flui sempre!
    Bjs
    pai

  2. Adorei a história do dentinho de leite. Sabes que fazes parte da vida duma criança quando ela te arreganha o beiço, feliz, para te mostrar que está a crescer!
    Um beijão*

  3. Oh meu Deus, baratas.

  4. teresa soares Says:

    Será que o q escrevi ontem não seguiu? Adoro ler a tuas descrições! Até os ratos e baratas me parecem seres simpáticos!!! Obrigado por partilhares todos esse teus sentimentos, que como sempre são mto ricos. Por cá td bem dp de 1 semana cheia de gente, de andares, de corredores, etc, etc. Mas foi mto bom e tou mto contente por termos dado esta satisfação à avó. Dp conversamos mais. Já tou a programar próximas férias e a minha cabecinha já não dá para tanto….hi,hi,hi! Bjões, barcelonesa de cabo verde, da titi

Deixe um comentário